sábado, 28 de fevereiro de 2015
sexta-feira, 27 de fevereiro de 2015
Branco é!
«(...) Mas não percebiam nem me perdoavam o facto de eu estar envolvido no 25
de Abril. Disseram-me que os tínhamos enganado, mas que eles já cá estavam, que se
estavam a organizar e que “qualquer dia iam tomar conta disto tudo e vingar-se de nós".»
É só contá-los.
É só contá-los.
Introdução à performance dramática contemporânea
Ou análise comparativa das linguagens que exprimem selvagens exóticos e indígenas comuns.
quinta-feira, 26 de fevereiro de 2015
Não é normal
Ao contrário do que afirmam por aí certos escroques, um estado normal não mete na cadeia preventiva um ex-primeiro ministro, sem claras, definidas e explícitas razões. E isto não é discriminação positiva, antes o dizem a história, o senso comum e o respeito de cada um por si próprio.
O encarceramento de Sócrates, que já tem mais três meses prometidos para investigações (e porque não sete?!), é parte duma Viradeira mais vasta. Não ver isto (que se repete na nossa história!) é usar palas de mula.
No ponto em que estão as coisas, só resta aos magistrados condená-lo, ou pendurar-se na figueira. Porém, incapazes de acusar e mostrar prova, estão a sentenciá-lo previamente na rua, através das fugas ao segredo de justiça.
Servindo-se de papagaios e de imprensa avençada, vão-lhes soltando não apenas factos do processo mas também palpites pessoais, íntimas convicções, fezadas subjectivas, suposições, ilações mirabolantes, fugas para a Argélia, para a Venezuela, para o Ushuaia... Ora isto não são fugas, são entregas. Para não dizer confidências entre sócios.
O encarceramento de Sócrates, que já tem mais três meses prometidos para investigações (e porque não sete?!), é parte duma Viradeira mais vasta. Não ver isto (que se repete na nossa história!) é usar palas de mula.
No ponto em que estão as coisas, só resta aos magistrados condená-lo, ou pendurar-se na figueira. Porém, incapazes de acusar e mostrar prova, estão a sentenciá-lo previamente na rua, através das fugas ao segredo de justiça.
Servindo-se de papagaios e de imprensa avençada, vão-lhes soltando não apenas factos do processo mas também palpites pessoais, íntimas convicções, fezadas subjectivas, suposições, ilações mirabolantes, fugas para a Argélia, para a Venezuela, para o Ushuaia... Ora isto não são fugas, são entregas. Para não dizer confidências entre sócios.
As Portas de Jerusalém
[Clicar ajuda]
Este relevo (que um Lopo fez em 1530) é observável numa fachada da Casa do Gato Preto, em Trancoso. E o facto de o rei Pedro Justiceiro ter concedido aos judeus judiaria apartada na rua onde sempre tinham vivido, mostra que a sua presença por aqui é anterior a esse reinado.
É conhecida a importância fundamental da comunidade judaica por estas terras, na época medieval. Nos finais do séc. XV a sinagoga foi ampliada, ao tempo em que os judeus eram expulsos de Espanha (1492).
Após a instalação da Inquisição em Portugal, em 1536, mais de quinhentos processos foram instaurados a judeus de Trancoso. E conta A. Herculano que, em dado momento, trezentas crianças judaicas ficaram por aí ao abandono, em resultado da perseguição movida aos pais. Algumas delas foram parar à ilha de São Tomé.
terça-feira, 24 de fevereiro de 2015
Atão foi assim
O preso 44 apareceu na cela com um par de botas que não trazia há três meses, e com razão vêm proibidas no regulamento. De formas que o Zé Luís, o director-adjunto do estabelecimento, logo interrogou seis guardas, pra saber qual deles foi o cabrão que deixou entrar aquilo.
O inquérito do Zé Luís não levou a conclusões. E a própria Direcção-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais recusou-se a confirmá-lo. Informou só que a DGRSP tem o dever de reserva sobre a situação dos presos, o qual abrange aquilo que diz respeito ao dia-a-dia da cadeia e dos seus trabalhadores. Quer dizer, a direcção-geral mandou foder o jornalista metediço.
O preso 44 veio a ser intimado a entregar as botas no depósito. Mas mandou foder os serviços e anda com elas calçadas. O seu advogado já pediu ao Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa que revogue a ordem de retirada das botas ao cabrão do 44. Mas o douto tribunal declarou-se incompetente em razão da matéria. De formas que ao advogado só restou o recurso hierárquico para o director em pessoa, que é o Sá Gomes.
No fim de tudo o cabrão do jornalista apenas pôde concluir que o director-adjunto, o Zé Luís, é o mesmo que os guardas acusaram de ceder o seu próprio gabinete, donde o preso 44 chegou a fazer chamadas telefónicas sem qualquer controlo.
Metido em tal par de botas, este escriba conclui e garante duas coisas: o jornalista metediço é do Público; e aos magistrados da corda e seus serviços prisionais não é o cabrãozeco dum preso 44 que vai agora fazer-lhes a eles o ninho atrás da orelha. Só nascendo duas vezes, conforme disse um dia o cabrão-mor. Tás a morder?!
Alianças
Trago cá dentro (entre muitas) uma guerra não declarada entre a escrita e a horta, que se disputam tempos e energias. Não me prometem amanhãs que cantam mas trazem-me salvamento, às vezes mesmo epifania e festa. No fundo não passam de mezinhas, caseiras e um pouco estranhas, ou manobras de povoamento do espírito e do corpo.
O Inverno pela-se por estas guerras-frias e é ardiloso no jogo das alianças. Pratica com a escrita uma paz mole, mas é um temível adversário da horta. O vencido acabo por ser eu, as mais das vezes, num tabuleiro e no outro. Mas nenhum mal dura sempre, já mo disse uma sibila.
O Inverno pela-se por estas guerras-frias e é ardiloso no jogo das alianças. Pratica com a escrita uma paz mole, mas é um temível adversário da horta. O vencido acabo por ser eu, as mais das vezes, num tabuleiro e no outro. Mas nenhum mal dura sempre, já mo disse uma sibila.
segunda-feira, 23 de fevereiro de 2015
Questões, questões, questões
Muito suspeito que no fim só resta uma enxurrada, um mar, onde ao bicho-homem convirá ter guelras e saber nadar. Mas isto sou só eu a suspeitar!
Milagres surpreendentes e percalços fatais
Que numa vilória ignota se reúna, domingo à tarde, um auditório a abarrotar de gente, para assistir à apresentação dum livro, é coisa surpreendente. Mesmo quando se trata de dois, que o autor decidiu defenestrar em simultâneo. Se a esse facto adicionarmos nós a programação letal das televisões generalistas, a pública e as privadas, que alegremente imolam consciências, composturas e critérios no altar das audiências, forçoso é estarmos diante dum milagre. Eu não sou crente, porém nestes milagres acredito.
Mas não convém embandeirarmos em arco e desperdiçar foguetes. Porque as artes em geral, e a literatura muito em particular, contam entre as suas múltiplas funções e finalidades alguma coisa de medicinas da mente, para não lhes chamar remédios do espírito dos homens. Dos leitores, e muito frequentemente dos autores.
Quando elas são sérias e eficazes, estas medicações geram equilíbrios, ganhos, sanidades novas. Se o não forem, produzem apenas os estilhaços dos efeitos secundários. Intoxicam ou entontecem, sendo aqui adequado dizermos que alienam. É mazela de que hoje se fala pouco mas existe.
E é exactamente aqui que o ponto bate. Desde o miolo artístico da obra (que são duas), às intervenções dos apresentadores (que foram meia dúzia), tudo neste evento se resumiu a um equívoco solipsista, centrado no umbigo. Ainda por cima improvisado, tosco e diletante. No fim restaram os estilhaços secundários e uma grande frustração.
As elites que aí andam conhecem há muito tempo o poder alienante destes xaropes estéticos. E porque mais lhes aprazem as massas de consumidores ruminantes do que os fruidores críticos e activos, servem-se desse poder sem resquícios de pudor. Hoje, aqui, fez-se-lhes um frete, com este ritual de missa-negra por certo não consciente.
E a cerejita no bolo é que todos os oficiantes são desgraçadamente professores. Quer dizer que a xaropada cultural se reproduz alegremente, por divisão celular. E o leitor fará melhor em aprender a nadar, perante tanta água. A ver se resiste à onda e à maré.
Mas não convém embandeirarmos em arco e desperdiçar foguetes. Porque as artes em geral, e a literatura muito em particular, contam entre as suas múltiplas funções e finalidades alguma coisa de medicinas da mente, para não lhes chamar remédios do espírito dos homens. Dos leitores, e muito frequentemente dos autores.
Quando elas são sérias e eficazes, estas medicações geram equilíbrios, ganhos, sanidades novas. Se o não forem, produzem apenas os estilhaços dos efeitos secundários. Intoxicam ou entontecem, sendo aqui adequado dizermos que alienam. É mazela de que hoje se fala pouco mas existe.
E é exactamente aqui que o ponto bate. Desde o miolo artístico da obra (que são duas), às intervenções dos apresentadores (que foram meia dúzia), tudo neste evento se resumiu a um equívoco solipsista, centrado no umbigo. Ainda por cima improvisado, tosco e diletante. No fim restaram os estilhaços secundários e uma grande frustração.
As elites que aí andam conhecem há muito tempo o poder alienante destes xaropes estéticos. E porque mais lhes aprazem as massas de consumidores ruminantes do que os fruidores críticos e activos, servem-se desse poder sem resquícios de pudor. Hoje, aqui, fez-se-lhes um frete, com este ritual de missa-negra por certo não consciente.
E a cerejita no bolo é que todos os oficiantes são desgraçadamente professores. Quer dizer que a xaropada cultural se reproduz alegremente, por divisão celular. E o leitor fará melhor em aprender a nadar, perante tanta água. A ver se resiste à onda e à maré.
domingo, 22 de fevereiro de 2015
A frase da semana
- «Nada nos limpará da indignidade de nos terem passado a mão pelo pêlo e termos abanado o rabo.» (Ferreira Fernandes)
Foi você
Que pediu um ministro das finanças que não atraiçoa o seu povo, e faz algo mais do que entregá-lo numa alcofa aos seus patrões, pela porta de serviço?!
sábado, 21 de fevereiro de 2015
O Samaras grego rosna
Um conservador da Nova Democracia, que governou a Grécia antes do Siryza, algum tempo depois da dinastia socialista de Papandreu. Esse mesmo que deixou a Tsipras a chave do gabinete debaixo do tapete, e levou para casa, escondido na casaca, o disco duro do computador. Esse mesmo que obedeceu caninamente à troika, e participou nas negociatas de submarinos alemães e aviões franceses a pretexto de Chipre e da Turquia, e alimentou a proverbial corrupção das elites gregas, e vendeu o Pireu aos chineses, e havia de vender a Pítia de Delfos se o deixassem, e transformou a sociedade grega num campo de ruínas, e conduziu o povo grego ao desespero.
Esse mesmo que, se fosse português, era por certo mais um reformador do PPD. Não surpreende que rosne do mesmo modo. Mutatis mutandis, claro!
Esse mesmo que, se fosse português, era por certo mais um reformador do PPD. Não surpreende que rosne do mesmo modo. Mutatis mutandis, claro!
Da capo
(É um texto que tem anos e já andou por aqui. Volta hoje porque a história foi assim, mais própria dum tempo antigo já esquecido: humana e primitiva, estranha mas exacta. Nos antes e nos depois.)
Lidoro
Lidoro
Um tal nome é
corruptela do vulgo, do original já não há quem se lembre. Tinha ressonâncias
clássicas perdidas, engendradas ninguém sabe como na cabeça do pai, a quem
chamavam filósofo. Isto quando voltou da Grande Guerra, de cabeça estonteada
pelos gases.
Hoje vive ali nas
Tapadinhas, a meio da encosta, como um anacoreta. Tem uma casita de chão
térreo, com uma porta por onde o sol espreita, sem entrar. Lá dentro cabe uma
vaca, duas cabras, e dúzia e meia de cães. Na horta há uma presa velha, de
águas-vivas. Basta-lhe a ele, aos bichos e ao renovo.
Quando calha apanha uma
perdiz, um laparoto incauto, se os cachorros ajudarem. Poda as vides da latada
em lhe chegando o tempo, e é delas que tira um palheto improvisado para adoçar
as invernias. Afora isso deixa o mundo correr.
Teve em tempos uma
namorada e desejos de fazer vida com ela. A mãe é que não deixou, no
entendimento dela não era mulher para ele. A namorada foi casar a outro lado, a
mãe morreu quando lhe chegou o dia, Lidoro ficou sozinho e mudou-se para as
Tapadinhas. Nunca mais voltou ao povo, que foi ficando deserto.
Já lhe ofereceram uma
casa da Misericórdia, um catre no lar dos velhos, mas ele escorraçou o
mensageiro. Diz que se fartou daquelas galgas, que não está para as aturar. As
galgas são as línguas das mulheres, quando se juntam na fonte. E ninguém lhe
deu notícia de que as galgas já morreram e deixaram de lá ir.
A pontada que lhe mói o
lado esquerdo já passa as noites com ele. A princípio ia e vinha, uma fraqueza
assim ao fim da tarde, talvez por mor do cansaço. Agora nem de madrugada o
larga. Prende-o à cama e só o vai largar quando acabar com ele. Mas Lidoro
ainda o não sabe.
Nessa altura, que não
tarda, os cachorros vão juntar-se à roda do seu dono, todo ausente, a mão
imóvel. Vão ganir-lhe, em voz chorada, a pressentir o pior. Vão ladrar-lhe, em
desespero, já sem esperança nenhuma. E vão uivar-lhe, raivosos deste abandono,
já toldados pelo instinto. Até que o primeiro deles lhe afoite na jugular os
caninos esfaimados.
O tempo virou molhado e pingão
Amanhã é tempo de leituras. Não haverá caminhada, nem combates na horta, nem artistas para o que urge fazer. Não é um sinal motivador.
sexta-feira, 20 de fevereiro de 2015
Sem mim
"... O Mediterrâneo vai tornar-se no mar do caos."
[Kadhafi, antes de ser caçado pelos aviões da NATO e sodomizado depois de morto pelos heróis das primaveras árabes]
[Kadhafi, antes de ser caçado pelos aviões da NATO e sodomizado depois de morto pelos heróis das primaveras árabes]
Duas dúvidas e uma certeza
«Atividades letivas suspensas». O anúncio aparece afixado à porta duma escola de Bragança, parada por uma greve de pessoal não docente.
E a minha primeira dúvida consiste em saber se isto ainda é a língua portuguesa que os séculos produziram. Se isto não é apenas um fruto amargo e bravio, gerado num sertão, à lei da natureza.
A minha segunda dúvida é o que terá levado Carlos Reis, um espírito com obrigações no ramo, a assumir a barricada da bondade do Acordo Ortográfico.
Certezas só tenho uma: a decadência insana em que Portugal caiu não conhece limites nem disfarces.
E a minha primeira dúvida consiste em saber se isto ainda é a língua portuguesa que os séculos produziram. Se isto não é apenas um fruto amargo e bravio, gerado num sertão, à lei da natureza.
A minha segunda dúvida é o que terá levado Carlos Reis, um espírito com obrigações no ramo, a assumir a barricada da bondade do Acordo Ortográfico.
Certezas só tenho uma: a decadência insana em que Portugal caiu não conhece limites nem disfarces.
100 anos
A velhota fez cem anos há pouco, e há nela motivos de algum espanto. Passa os dias ao lado da lareira, num cadeirão articulado que os filhos lhe arranjaram. Lê sem óculos os livros de orações pias, mas não rejeita um jornal quando aparece. Come por mão própria sem fastios, e não se queixa de mazelas corporais. Dorme duma assentada quinze horas todas as noites, sem interrupções nem insónias. Não tem açúcares altos, nem tensões caprichosas, nem colesteróis gulosos, nunca toma uma simples aspirina. Reconhece todas as pessoas que a visitam e sabe o nome delas. Já não se põe de pé sem uma ajuda, mas vai para o quarto sozinha, pilotando o andarilho em que se apoia.
Pela-se por uma boa conversa, embora não oiça bem. E quando me tem à mão aproveita-se disso e eu alimento-o. Conta-me histórias da sua vida, que foi sempre tão dura quanto é longa, sobretudo de quando era novata. Eu falo-lhe de peripécias que vivi com ela, só para a espevitar. Recorda-as e reconhece-as, mas é raro chamá-las à conversa.
Às vezes dou-me a pensar que cem anos de vida é muito tempo, porém o caso dela encarrega-se de mostrar que nem sempre é verdade. Há dias em que me faz notar que só está à espera que Deus se lembre dela e a mande chamar. Ele é que não quer saber e deixa andar. E cá dentro torna-se mais aguda e consciente a precaridade da vida dos muitos velhos que apanham pneumonias em casas geladas, e acabam por morrer de solidão numa urgência de hospital,
Claro que tudo isto tem um preço. Mas no mundo sonhado por certos cães só haverá salvamento, se cada um fizer o que deve e em casos pode ser feito.
Pela-se por uma boa conversa, embora não oiça bem. E quando me tem à mão aproveita-se disso e eu alimento-o. Conta-me histórias da sua vida, que foi sempre tão dura quanto é longa, sobretudo de quando era novata. Eu falo-lhe de peripécias que vivi com ela, só para a espevitar. Recorda-as e reconhece-as, mas é raro chamá-las à conversa.
Às vezes dou-me a pensar que cem anos de vida é muito tempo, porém o caso dela encarrega-se de mostrar que nem sempre é verdade. Há dias em que me faz notar que só está à espera que Deus se lembre dela e a mande chamar. Ele é que não quer saber e deixa andar. E cá dentro torna-se mais aguda e consciente a precaridade da vida dos muitos velhos que apanham pneumonias em casas geladas, e acabam por morrer de solidão numa urgência de hospital,
Claro que tudo isto tem um preço. Mas no mundo sonhado por certos cães só haverá salvamento, se cada um fizer o que deve e em casos pode ser feito.
quinta-feira, 19 de fevereiro de 2015
O recado da terra dos vulcões
É um e é simples. Por mais que isso doa às elites que aí andam, duns fariseus que esfolam os seus povos. A própria mãe punham eles a render, se isso lhes trouxesse dividendo.
quarta-feira, 18 de fevereiro de 2015
Recolher
Chegou a noite. E eu lá vou, calçada acima, a caminho de casa. Os toques ritmados do bastão encastoado que já foi dum almirante ressoam na canada. Veio-me parar à mão há muitos anos, este resquício duma história trágico-marítima. Andou atrás de mim e agora dá-me jeito, é o que sucede a quem guarda o que não presta.
Quando passo o pontão do ribeiro caem as primeiras gotas. Esparsas e desgarradas, andam suspensas no ar e não chegam a molhar. Isto enquanto passa lá por cima, a dez mil pés de altitude, um avião civil no corredor aéreo.
Vem-me à ideia o traste do passageiro, pobre dele, que se lembrou mesmo agora de usar à casa de banho. Rio-me da graçola estúpida, meto o livro na aba do casaco e acelero o passo. Embora saiba muito bem que é isso que merece a maior parte dos livros que nascem por aí como tortulhos. Logo veremos se também é o caso deste.
Quando passo o pontão do ribeiro caem as primeiras gotas. Esparsas e desgarradas, andam suspensas no ar e não chegam a molhar. Isto enquanto passa lá por cima, a dez mil pés de altitude, um avião civil no corredor aéreo.
Vem-me à ideia o traste do passageiro, pobre dele, que se lembrou mesmo agora de usar à casa de banho. Rio-me da graçola estúpida, meto o livro na aba do casaco e acelero o passo. Embora saiba muito bem que é isso que merece a maior parte dos livros que nascem por aí como tortulhos. Logo veremos se também é o caso deste.
terça-feira, 17 de fevereiro de 2015
Onde isto vai!
«(...) Falo de uma notícia lançada pelo CM paper e da entrevista no CMTV a que assisti, onde Mário Machado [líder do PNR] admite com todas as letras que ele e dois amigos assaltaram, a pedido de um membro do governo actual, a casa de um tio de Sócrates para roubar os papéis entregues ao procurador e que levaram à abertura do processo. As notícias pura e simplesmente desapareceram, a entrevista nem sequer foi mencionada pelos outros canais televisivos, nada. Que diabo se anda a passar? Isto é demasiado grave. Um membro do governo!»
[Pescado aqui em comentários]
[Pescado aqui em comentários]
sexta-feira, 13 de fevereiro de 2015
Um paradigma e um laboratório
«(...) A Grécia é hoje um caso limite de experimentação biopolítica, um país inteiro tornou-se uma forma derivada dos campos, um lugar habitado não já por um povo ou por uma sociedade histórica, mas por uma mera população supérflua. Desapossados de toda a soberania e coagidos a erradicar a política como instância de mediação entre a economia e o social, os gregos estão reduzidos a um projecto de experimentação dos princípios económicos de um biopoder que delimita e designa populações – e segmentos de populações – suspeitas, inúteis e supérfluas. Em termos técnicos, trata-se de induzir uma desvalorização interna da população grega, já que não é possível uma desvalorização da moeda, com objectivos sanitários: trata-se de curar um país, de lhe mostrar que o remédio está no mal. O eixo estratégico do biopoder reside agora no corpo múltiplo de um organismo transindividual – um país, uma nação, um povo – como alvo de tecnologias disciplinares. Todos aqueles que, por cá, dizem que “nós não somos a Grécia” ou são ignorantes ou apenas querem esconder o que estamos a caminho de ser: porque a Grécia não é um “caso” excepcional, é um paradigma e um laboratório. Nela podemos ver a antecipação e a forma extrema (isto é, aquela onde uma realidade ainda imprecisa se revela) da reconfiguração em marcha das sociedades ocidentais, onde já se começou a passar ao acto e a planificar a eliminação lenta, discreta e politicamente correcta dos supranumerários, cuja existência faz ascender ao vermelho as somas necessárias para manter os dispositivos de protecção. Velhos, reformados, doentes crónicos, deficientes, desempregados dificilmente recicláveis, imigrantes, segmentos da juventude não qualificada: todos eles representam heterogeneidades parasitárias que não podem ter lugar no quadro ideal de crescimento e produção de riqueza exigidos pelo capitalismo ultra-liberal. Impõe-se, por isso, a sua eliminação. É o que está a acontecer, aqui e agora, diante dos nossos olhos: o campo como paradigma biopolítico, com as suas práticas de eliminação subtil, está em expansão acelerada; e da sorte funesta reservada às existências que são como empecilhos começamos a ter testemunhos cada vez mais frequentes. Até os mais distraídos já perceberam que é só uma questão de tempo para chegar a sua vez. E os que não forem eliminados servirão para alimentar uma regressão organizada às claras a formas de exploração que têm muitas afinidades com as que alimentaram a expansão do capitalismo no século XIX.»
[António Guerreiro, Público / com vénia]
[António Guerreiro, Público / com vénia]
quinta-feira, 12 de fevereiro de 2015
Aquilo que tem que ser...
A austeridade que estas elites bastardas inventaram para responder à crise financeira que a América produziu, aliada à multímoda corrupção interna (a própria e a induzida), transformaram a Grécia numa tragédia humanitária. Em seis anos a economia contraiu 25%; o desemprego vai em 25% da população activa; 60% da juventude grega não tem qualquer perspectiva de vida e de futuro; e a hidra da dívida atingiu valores incomportáveis, que uma economia em ruínas não tem qualquer hipótese de pagar.
Para garantir a confiança dos credores, à Grécia falta apenas vender a Pitonisa a uma casa de alterne de Roterdão; e as colunas do Parténon a um museu de Berlim; e o Peloponeso inteiro a um empresário flamengo; e as tíbias de Platão a um banqueiro da City.
Entre a espada e a parede, os gregos responderam às elites com as armas que ainda detinham: elegeram o Siryza, repudiaram a troika, exigem outras políticas.
Mas pôr em causa a ordem estabelecida é desde há muito a hybris da tragédia. O FMI, o BCE, a Comissão, o Eurogrupo, a troika, o Draghi, o Juncker, a Lagarde, a Merkel e todos os fariseus calvinistas, o Cavaco, o Coelho e os seus sipaios, a ministra dos SWAPS, os papagaios analistas e comentadores e especialistas avulsos... toda essa gente sabe muito bem que a política aplicada na Grécia levou o país a um ponto de não-retorno. E outros há que estão na lista, com Portugal à cabeça.
Por isso nenhum deles tolera o exemplo grego, nem o seu governo de aventureiros que não aceitam gravata nem cabresto. Em face do Portugal que aí está, todos eles podem limpar as mãozinhas à parede. Mas transformam o país num mítico modelo de sucesso, porque todos esses fariseus querem salvar a face, se não for antes preservar o coiro.
Só que, conforme os gregos ensinaram há séculos, tudo o que tem que ser tem muita força.
Para garantir a confiança dos credores, à Grécia falta apenas vender a Pitonisa a uma casa de alterne de Roterdão; e as colunas do Parténon a um museu de Berlim; e o Peloponeso inteiro a um empresário flamengo; e as tíbias de Platão a um banqueiro da City.
Entre a espada e a parede, os gregos responderam às elites com as armas que ainda detinham: elegeram o Siryza, repudiaram a troika, exigem outras políticas.
Mas pôr em causa a ordem estabelecida é desde há muito a hybris da tragédia. O FMI, o BCE, a Comissão, o Eurogrupo, a troika, o Draghi, o Juncker, a Lagarde, a Merkel e todos os fariseus calvinistas, o Cavaco, o Coelho e os seus sipaios, a ministra dos SWAPS, os papagaios analistas e comentadores e especialistas avulsos... toda essa gente sabe muito bem que a política aplicada na Grécia levou o país a um ponto de não-retorno. E outros há que estão na lista, com Portugal à cabeça.
Por isso nenhum deles tolera o exemplo grego, nem o seu governo de aventureiros que não aceitam gravata nem cabresto. Em face do Portugal que aí está, todos eles podem limpar as mãozinhas à parede. Mas transformam o país num mítico modelo de sucesso, porque todos esses fariseus querem salvar a face, se não for antes preservar o coiro.
Só que, conforme os gregos ensinaram há séculos, tudo o que tem que ser tem muita força.
quarta-feira, 11 de fevereiro de 2015
Há quem lamente
Se não mesmo quem proteste, quando se usa por aqui linguagem mais vernácula.
Onde, porém, a definição cabal desta cavalgadura, que não seja a dum filho de puta refinado.
Onde, porém, a definição cabal desta cavalgadura, que não seja a dum filho de puta refinado.
Augusta
Era uma das crias da numerosa ninhada do latoeiro da aldeia, no tempo em que havia disso. E bem fazia ele o que sabia pelo sustento do rebanho, fosse a martelar na folha novos apetrechos da arte, fosse a remendar a soldas a ferrugem dos antigos. A mulher cozia pão no forno comunitário. E Augusta, já espigadota, vendia-o nas redondezas.
Um dia chegou a altura da rapariga pensar no casamento. E ela casou, com um africanista que saíra há anos dum povo da terra quente, e governava a vida num sertão da Zambézia. A moça mandou-lhe fotografia, e o casamento fez-se por procuração.
Augusta nunca pensou que o mundo fosse tão grande, nem que fosse tão custoso dar-lhe a volta até ao fim. Mas acabou por chegar ao seu destino. O pior veio depois, por achar o africanista que a bota não dava com a perdigota. O muito que a foto lhe prometera não acertava com o pouco que a mulher apresentava. E logo a repudiou.
Augusta refugiou-se nuns parentes afastados, ninguém sabe hoje dizer com que alma sobreviveu. Mas consta que anos mais tarde o casal se recompôs, sem ter chegado a dar fruto. Até que a morte apareceu, ou a vida, quem o sabe, e encerrou aquele equívoco.
Um dia chegou a altura da rapariga pensar no casamento. E ela casou, com um africanista que saíra há anos dum povo da terra quente, e governava a vida num sertão da Zambézia. A moça mandou-lhe fotografia, e o casamento fez-se por procuração.
Augusta nunca pensou que o mundo fosse tão grande, nem que fosse tão custoso dar-lhe a volta até ao fim. Mas acabou por chegar ao seu destino. O pior veio depois, por achar o africanista que a bota não dava com a perdigota. O muito que a foto lhe prometera não acertava com o pouco que a mulher apresentava. E logo a repudiou.
Augusta refugiou-se nuns parentes afastados, ninguém sabe hoje dizer com que alma sobreviveu. Mas consta que anos mais tarde o casal se recompôs, sem ter chegado a dar fruto. Até que a morte apareceu, ou a vida, quem o sabe, e encerrou aquele equívoco.
terça-feira, 10 de fevereiro de 2015
Este filme
É um remake do já visto nos finais do consulado cavaquista de há uns anos. O ambiente político era irrespirável, para não dizer que era tóxico. E o cartão do PPD uma gazua que abria todas as portas.
Foi preciso ver a choldra pelas costas, para sanear isto tudo. Nem admira que a cena se replique, agora pela mão destes bastardos que são o último refugo da quadrilha.
Foi preciso ver a choldra pelas costas, para sanear isto tudo. Nem admira que a cena se replique, agora pela mão destes bastardos que são o último refugo da quadrilha.
segunda-feira, 9 de fevereiro de 2015
domingo, 8 de fevereiro de 2015
Precariedades
O Zé mora numa casa de escadaria e alpendre, desenhada em tempos por algum jeitoso vendedor de caramelos, que faz uns riscos para entregar na câmara. Muito bem à portuguesa. O alpendre e a escadaria, cobertos de falso mármore, são feitos de ladrilhos espelhados. E foi há dias que um algeroz em mau estado os cobriu de água que gelou durante a noite.
O Zé começou o dia a patinar. Estatelou-se no alpendre e acabou a contar as escadas uma a uma. Na emergência, o que podia ser feito era levá-lo ao centro de saúde.
O médico decidiu rapidamente evacuar o Zé para a urgência hospitalar, onde melhor poderiam esmiuçar-lhe os costados. Mas o Zé não achou bem, era uma perda de tempo, o que ele queria era voltar para casa. E lá voltou, porque é teimoso e o físico resignou-se.
O Zé recolheu-se à cama. E quando os costados se lhe queixaram a sério, lá mandou a mulher pedir ajuda. Queria ir consultar um entendido, um endireita de muita nomeada.
Depois de alguns esticões o bruxo diagnosticou-lhe umas costelas partidas, aplicou-lhe um bom pegão e aconselhou-o a recolher à cama. O bom do Zé já tem ali para meses!
O Zé começou o dia a patinar. Estatelou-se no alpendre e acabou a contar as escadas uma a uma. Na emergência, o que podia ser feito era levá-lo ao centro de saúde.
O médico decidiu rapidamente evacuar o Zé para a urgência hospitalar, onde melhor poderiam esmiuçar-lhe os costados. Mas o Zé não achou bem, era uma perda de tempo, o que ele queria era voltar para casa. E lá voltou, porque é teimoso e o físico resignou-se.
O Zé recolheu-se à cama. E quando os costados se lhe queixaram a sério, lá mandou a mulher pedir ajuda. Queria ir consultar um entendido, um endireita de muita nomeada.
Depois de alguns esticões o bruxo diagnosticou-lhe umas costelas partidas, aplicou-lhe um bom pegão e aconselhou-o a recolher à cama. O bom do Zé já tem ali para meses!
sábado, 7 de fevereiro de 2015
sexta-feira, 6 de fevereiro de 2015
O Correio da Manha diz
«Que o procurador [Teixeira] afirma (!), que os pressupostos da prisão preventiva – nomeadamente o da perturbação do inquérito e o perigo de fuga – estão ainda mais fortes. O facto de Sócrates e do próprio advogado, João Araújo, se desdobrarem em entrevistas assim o enuncia (!). E as ligações de Sócrates à América Latina fariam com que facilmente o ex-primeiro-ministro conseguisse asilo político num país daquela região (!).» Bene trovato, ó Rosário!!!
quinta-feira, 5 de fevereiro de 2015
Alçapões
O primeiro papa espanhol, vindo dos Borgia, foi Calixto III, soprado aos cardeais por um espírito santo de orelha em 1455. O segundo foi Rodrigo Borgia, eleito em 1492 com o nome de Alexandre VI. Um pasquim de Roma escrevia então: "O papado foi para quem pagou mais aos que gerem a urna da santa lotaria."
Passava-se isto num tempo em que a barcaça da Roma Católica mais que nunca naufragava no vício, na simonia, na imoralidade, no escândalo desbragado, na orgia, no assassinato, na criminalidade. E muito antes de ser papa, já Rodrigo Borgia era cardeal, um insubstituível vice-chanceler. É nessa condição que durante anos mantém com a Vannozza uma relação oculta, da qual resultaram quatro filhos: Juan, Cesare, Lucrécia e Jofré. A Filha do Papa é esta renomada Lucrécia.
Na cultura italiana, Dario Fo é uma figura dada ao teatro, enquanto autor, actor, mimo, palhaço, saltimbanco, crítico iconoclasta, entre múltiplos papéis. Em 1997 foi-lhe dado o Nobel da Literatura, num gesto que surpreendeu. E é seu o presente romance, que a D. Quixote da Leya pôs no mercado.
Eu trouxe-o para casa, porque em má hora o encontrei na livraria e fui no engodo. Mas nem ele é coisa que se chame romance, nem traz nada de novo que mereça referência e justifique o preço. É apenas mais um desperdício, disfarçado de alçapão perfeito.
Um filho da puta
A quem um sertão fez crescer as orelhas, que é escritor de best-sellers de dia, que é pivot da RTP à noite, que é repórter de guerra ao fim de semana, que ganha um salário milionário, e que foi à Grécia fazer figuras de urso e mostrar Portugal como uma terra de imbecis sem remissão.
quarta-feira, 4 de fevereiro de 2015
Isto é:
Esperar que as galinhas ponham ovos, com a putéfia da raposa de cama feita dentro do galinheiro.
segunda-feira, 2 de fevereiro de 2015
Para onde foi a massa
No caso da Grécia. «Conforme mostra este gráfico do FT, todo o dinheiro do bailout, com excepção de cerca de 11%, regressou directamente aos detentores de dívida grega, por uma via ou por outra.»
A Irlanda, essa, tem direito a lágrimas de crocodilo por parte do FMI.
Já em Portugal, os traidores servem os donos. Como qualquer tropa de sipaios.
A Irlanda, essa, tem direito a lágrimas de crocodilo por parte do FMI.
Já em Portugal, os traidores servem os donos. Como qualquer tropa de sipaios.
Mal chegue o Verão
Sabes o que é uma fritilária?
Já provaste alguma vez os bagos da uva-espim?
E o selo-de-salomão, já viste?
Hei-de mostrar-tos na horta, deixa o Inverno passar!
Já provaste alguma vez os bagos da uva-espim?
E o selo-de-salomão, já viste?
Hei-de mostrar-tos na horta, deixa o Inverno passar!
domingo, 1 de fevereiro de 2015
A melhor cidadezinha para viver
Viseu foi há tempos considerada a melhor cidadezinha para viver. E tem um centro de camionagem que é uma construção recente. São múltiplos cais de embarque debaixo dum telheiro, à volta dum descampado, e corre neles um vento que chega da Sibéria. É improvável sobreviver nos bancos de madeira, encostados à parede.
O interior do rés-do-chão está vazio. Rodeado de guichés que ninguém usa, em todo o átrio não há um único banco. Mas lá fora, lá ao fundo, existe um elevador, um monta-cargas de ferro que já transportou gado, e sobe ao 1º andar.
No piso superior há um café, e uma banca de jornais, e guichés de empresas de camionagem de portinholas corridas. O ambiente é limpo e mais ameno. Mas dos bancos corridos que ali estão não se podem controlar os autocarros que chegam, e se dirigem à Guarda, e a Lisboa, a Coimbra, à Covilhã, a Bragança, a Vila Real... Ou à Espanha, à Suíça, ao Luxemburgo...
Tiro as luvas, tomo notas, já me gelaram os dedos. Sinto que estou na Ucrânia, num arrabalde qualquer do pólo norte, quem sabe se não cheguei ao Ushuaia. Dois jovens dedilham smartphones, e há mulheres de ancas redondas que passeiam para ludibriar os pés.
Eu volto a calçar as luvas e arrasto por ali o carrinho das rodas, e mando para o caralho as elites que aí andam, e os autarcas dinossauros que nos têm governado, e os ministros todos desta penúria austera, e os gestores da coisa pública, e os arquitectos que riscaram estes planos. Desço no monta-cargas do gado e volto outra vez ao frio, não me aconteça perder o autocarro. Que já chegou e reserva algum calor.
Lá fora estão quatro graus, porém os Lampiões estão a ganhar.
O interior do rés-do-chão está vazio. Rodeado de guichés que ninguém usa, em todo o átrio não há um único banco. Mas lá fora, lá ao fundo, existe um elevador, um monta-cargas de ferro que já transportou gado, e sobe ao 1º andar.
No piso superior há um café, e uma banca de jornais, e guichés de empresas de camionagem de portinholas corridas. O ambiente é limpo e mais ameno. Mas dos bancos corridos que ali estão não se podem controlar os autocarros que chegam, e se dirigem à Guarda, e a Lisboa, a Coimbra, à Covilhã, a Bragança, a Vila Real... Ou à Espanha, à Suíça, ao Luxemburgo...
Tiro as luvas, tomo notas, já me gelaram os dedos. Sinto que estou na Ucrânia, num arrabalde qualquer do pólo norte, quem sabe se não cheguei ao Ushuaia. Dois jovens dedilham smartphones, e há mulheres de ancas redondas que passeiam para ludibriar os pés.
Eu volto a calçar as luvas e arrasto por ali o carrinho das rodas, e mando para o caralho as elites que aí andam, e os autarcas dinossauros que nos têm governado, e os ministros todos desta penúria austera, e os gestores da coisa pública, e os arquitectos que riscaram estes planos. Desço no monta-cargas do gado e volto outra vez ao frio, não me aconteça perder o autocarro. Que já chegou e reserva algum calor.
Lá fora estão quatro graus, porém os Lampiões estão a ganhar.
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